SENHORES PAIS


Os filhos devem aprender a disciplina pelas conseqüências de seus atos.


Na educação dos filhos, os pais muitas vezes tentam poupá-los do medo, da raiva, da tristeza e da vergonha. Não querem que os filhos sintam dor, nem sofram. Outras vezes, expõem os filhos prematuramente a emoções negativas. É difícil alcançar o equilíbrio.
Querer controlar demais os filhos é uma tarefa fadada ao fracasso. Por exemplo, acabei de falar com um jovem de 18 anos. Ele é muito resistente para se relacionar. Faz uso freqüente da agressividade passiva, ou seja gosta de fazer os outros sofrerem sem demonstrar o que sente. No fundo, ele tem uma profunda raiva pela maneira como foi criado, apesar de a mãe ter feito o que pôde e o que não pôde para que fosse bem tratado pela tia que tomava conta dele. Após muito esforço para deixar a raiva aflorar, hoje ele disse: “Eu fiquei com muita raiva de minha mãe.” Perguntei: “O que aconteceu?” Ele relatou que, quando tinha cinco anos de idade, foi com a mãe a um parquinho. Lá havia uma barraca onde se podia pescar peixinhos de plástico e ganhar prêmios. Ele queria pescar, queria acertar o anzol na argola do peixinho. Estava difícil para sua coordenação motora. A mãe ficou muito ansiosa e tomou a vara dele. Acabou o tempo e ela também não pegou nada. Ele nunca mais a perdoou pela intromissão. Muitas vezes é isso que acontece quando os pais correm na frente dos filhos e não os deixam experimentar os momentos da vida. São nesses momentos de acertos e erros que eles constroem sua bagagem, seu repertório, sua experiência de vida. Tal experiência irá capacitá-los a assumir as tarefas mais complicadas da vida adulta. Impedi-los de tentar é uma técnica garantida para incapacitá-los para as responsabilidades da maturidade. Há pais que começam muito mais cedo a impedir que os filhos sintam as conseqüências do próprio comportamento. Podemos observar uma criança provocando a mãe ao jogar a chupeta no chão. Ela joga, a mãe pega; joga de novo e a mãe pega novamente. O jogo segue por várias vezes; é o mesmo ritual se repetindo. O pior é que às vezes a mãe pega sorrindo e feliz da vida. Depois, a criança joga a colher e a mãe pega. Mais tarde, ela joga a roupa no chão porque não quer vestir e a mãe pega. A mãe sempre pega. Um dia a mãe está irritada, ou nervosa, ou cansada, ou tudo isso junto e em vez de pegar dá uns tapas. O problema não foi resolvido; foi apenas interrompido. Chega uma hora que a criança pega algo na escola e a mãe não a faz devolver. “É só uma borracha!” Aí aparece um brinquedo em casa. A mãe vai e devolve para poupar a criança da vergonha de devolver. A adolescência chega, o filho pega a chave do carro e sai, tarde da noite, enquanto os pais estão dormindo. Bate o carro, chama os pais e lá vão eles para livrar a pele do filhinho. Fica reprovado na escola, os pais dão um jeito e passa, ou arrumam uma escola que não reprove. Engravida a namorada, e os pais providenciam o aborto. Engravida outra que não faz o aborto, e os pais têm que sustentar o neto. Quando a criança vai crescer? Crescer é amadurecer e amadurecer é aprender. Aprender é direcionar o comportamento, assumindo as conseqüências. É mudar o comportamento, incorporar novas respostas, exercer o controle sobre a própria ação, praticar a disciplina. Hoje, diz-se que é exercitar a auto-regulação dos próprios atos. É prestar atenção nos efeitos do que faz e arcar com ônus causado.

Respostas e reforço
Parece que a psicologia pode colaborar conosco apresentando alguns conceitos irrefutáveis sobre o processo de aprender. Podemos partir de dois pontos de vista para chegar ao mesmo resultado. Um deles é a lei do efeito. Segundo essa lei, o resultado satisfatório nos leva a adquirir uma resposta, a incorporar um comportamento. Se o efeito for positivo, a nosso favor, tentamos de novo a mesma resposta para ter o mesmo resultado desejado. Partimos de respostas simples para respostas complexas. É claro que, quanto mais complexa for a ação, mais difícil será a sua interpretação. Outro enfoque parecido é o conceito de reforço. Isso significa que, se houver recompensa para uma resposta dada pelo indivíduo, haverá a tendência de repetir a mesma resposta. É assim que aprendemos boa parte de nossos comportamentos. A repetição da resposta tem a ver com o reforço, a recompensa, o prêmio. Desde os primeiros momentos de vida, a criança experimenta esse processo. Se os pais ficam contentes com o recém-nascido, as coisas fluem mais fácil. Se a mãe está feliz quando o bebê olha para ela, ela sorri para ele. Quanto mais ela sorri, mais ele vai olhar. Se a mãe não sorrisse, nem fizesse qualquer outra mímica de aprovação, ele não olharia mais para a mãe. Muitos de nossos comportamentos são condicionados.
Há outros elementos que entram no processo de aprender, de elaborar a experiência e de construir o repertório de recursos pessoais. São fatores como o ambiente, a biologia, as circunstâncias, o contexto e a própria escolha do indivíduo. O poder de escolha individual é importantíssimo porque pode redirecionar qualquer expectativa de efeito ou de reforço.
Tendo em vista o efeito, o reforço, o contexto e a escolha, é de suma importância deixar a criança aprender pelas conseqüências das opções que faz. Ela precisa saber que o controle deve vir de dentro dela e não de fora. Ela é a responsável pelo seu comportamento. Essa é uma experiência que causa dor e traz sofrimento, mas é inevitável.

Crescer é sofrer
Aqui é onde os pais amolecem e se perdem, pensando que podem impedir os filhos de sofrer. Eles se esquecem de que crescer é sofrer, pois não há mudança sem dor. A criança está se transformando a cada dia, deparando-se com novas exigências típicas da idade, as quais precisa cumprir para evoluir. As exigências são tarefas variáveis conforme a idade. Se a criança executá-las, amadurece. Se os pais fizerem tudo por ela, estão incapacitando-a para obrigações típicas da vida.
Pensemos num comportamento simples: tomar banho e deixar a toalha molhada jogada no chão. A mãe resmunga, xinga, mas pega a toalha. A conseqüência imediata é a raiva contida da mãe, uma, duas, dez vezes, sem nada acontecer. A conseqüência futura será raiva do cônjuge.
Seria bom a criança aprender com as conseqüências. Deixe a toalha no chão. No próximo banho, ela pega a toalha. Pode durar uma semana, quinze dias, mas a criança aprende. Assim que os filhos percebem a determinação dos pais de deixá-los arcar com as conseqüências, eles mudam de idéia rapidinho. Deixar a criança sofrer as conseqüências do comportamento não é punição. Pela punição, a criança se torna reativa e não ativa. Ela cresce e passa a reagir diante do mundo com medo, inibição, insegurança, raiva reprimida, inadequação social e falta de intimidade, resultando em uma série de problemas de relacionamento. Seu referencial será o exterior e não o seu próprio interior.
Ela vai passar a vida buscando fora de si a explicação para o que lhe acontece. Quando os pais deixam o filho arcar com as conseqüências, estão expressando aceitação, não rejeição. Estão aceitando que o filho arque com os efeitos da escolha que fez. Se ele quer a toalha seca, que a pendure. Se a tolha molhada não o incomoda, por que o pai ou a mãe vai se desesperar? É preciso paciência, firmeza e determinação.
Quanto mais cedo o filho compreender que a vida consiste de custos e benefícios, perdas e ganhos inerentes em cada ação, melhor. Na aplicação das conseqüências, os pais mostram as opções. Quando se dá uma opção, é necessário aguentar as conseqüências da escolha feita. O filho aprende a se ver como agente, ator, autor, iniciador de uma ação, quando arca com as conseqüências de suas escolhas, de seus atos e de suas relações. Ele descobre que pode se controlar quando paga pelo que faz.
É deixando os filhos assumirem as conseqüências de suas escolhas que os pais permitem que eles se independam. Só assim eles aprenderão a seqüência dos eventos, a hierarquia dos privilégios, a ordem das coisas e as preferências pessoais. Só assim poderão mudar e incorporar novas idéias que tornarão a caminhada existencial mais suave. Os filhos merecem a oportunidade de escolher e pagar o preço pela escolha feita.
Faz bem recordar que, assim como os músculos se fortalecem pela prática e pelo exercício, a autoconfiança do filho brota quando a força pessoal vence barreiras entre ele e seus ideais. Criar um filho com êxito é prepará-lo, com amor e limites, para aceitar as conseqüências de seus atos certos ou errados, bons ou ruins, positivos ou negativos.


Fonte:Belisário Marques é doutor em psicologia pela Universidade de Maryland, nos Estados Unidos. (Revista Vida e Saúde)Matéria enviada.

Postado por Pedagogia Unoparvirtual


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